Governo e Poder
Gilvan Rocha(*)
Aproximam-se as eleições. No seu bojo
vem o velho equivoco em torno dos conceitos de governo e poder. A burguesia tem
todo interesse em passar a ideia de que governo e poder são as mesmas coisas.
Dizendo melhor, ela tem interesse que se imagine ser a conquista do governo o
mesmo que a conquista do poder. Em decorrência disso, poucos são os que
percebem ser governo e poder categorias distintas. Governos são temporários,
rotativos. Enquanto isso, o poder tem caráter permanente, ou seja, governos vão
e vem e o poder permanece.
Temos um sistema sócioeconômico, o
capitalismo. Em defesa dele existe o poder exercido pelo Estado, pelos aparatos
judiciais e legislativos, pelas forças armadas e policiais, tudo isso calcado
em um conjunto de leis e doutrinas cujo princípio é a manutenção da “ordem”.
Por outro lado, observamos que existem várias políticas de gerenciamento do
capitalismo. É em torno das diferentes políticas econômicas que se dão as
disputas eleitorais no âmbito do sistema. Assim, cada governo encarna uma
política de gerenciamento, uma política econômica, seja ela neoliberal,
nacionalista, nacional-reformista...
Os governos, portanto, tem liberdade
para implementar determinadas políticas econômicas, mas, caso algum governo
ouse conflitar-se com os interesses maiores do sistema, ou mesmo, se mostre
frágil ao ponto de colocar em risco o “status quo”, esse governo será,
fatalmente, deposto, pouco importando o que digam “a carta magna” ou os
discursos democráticos. A deposição de governos pelo poder é fartamente
registrada pela história, merecendo destaque a derrubada do governo
nacional-reformista de João Goulart e de Salvador Allende no Chile, para
citarmos, apenas, dois exemplos.
No rastro da confusão entre os conceitos
de governos e poder vem a confusão quanto a natureza das oposições. Uma coisa é
opor uma política econômica a outra política econômica. Completamente diferente
é fazer-se oposição ao próprio sistema econômico. Na primeira hipótese, vamos
encontrar diferentes segmentos comprometidos com o próprio sistema. No caso de
oposição a economia capitalista, vamos encontrar, apenas, os verdadeiros
socialistas, aqueles que estão bem além de um simples rótulo, de um simples
carimbo.
A confusão entre governo e poder é um
ato deliberado da cultura burguesa. Lamentável é ver a chamada esquerda, que
teria o dever de denunciar essa manobra, compartilhar, por ignorância ou
conveniência, desse desastroso equívoco. Em síntese, governo é, apenas, governo
e está subalterno ao poder. É ilusório, portanto, que se pretenda chegar ao
poder a partir da conquista do governo. Essa ilusão tem nos levado a desastres,
cabendo ressaltar, além dos exemplos de João Goulart e Salvador Allende, os
exemplos de Largo Caballero na Espanha, Juan Torres na Bolívia, Jacobo Arbenz
na Guatemala, Sukarno na Indonésia, casos que redundaram na implantação de
ditaduras sanguinárias. Por sua vez, vale registrar os exemplos de “bom
comportamento” do PT inglês e da social democracia européia. Estes não
conflitaram com o sistema e se reservaram a tarefa de gerenciar o capitalismo
para demonstrá-lo viável, palatável, exequível, o que representa uma postura
enganosa.
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