quarta-feira, 30 de julho de 2014

Veneno e Leite



Veneno e Leite

Em artigo intitulado “Forma e Conteúdo”, já havíamos recorrido ao argumento que ora voltamos a usar. Procedemos, dessa forma, no convencimento de que é necessário repetir essa afirmação, exaustivamente.  

Suponhamos que se encha uma garrafa com veneno e coloquemos nela o rótulo: Leite. Aquele que se ativer somente ao rótulo, sem atentar para o conteúdo, vai, provavelmente, cometer um supremo erro.

Foi, e ainda é, isso o que aconteceu e acontece com o socialismo. A causa revolucionária foi derrotada na década de vinte do século passado. Porém, essa derrota não foi assumida, como ocorrera por ocasião da Comuna de Paris, em 1871.

Na Rússia, a revolução de 1917 só poderia se consolidar caso avançasse o socialismo na Europa Ocidental. Profeticamente, Lenin afirmou, em 1919: “Ou a revolução triunfa no Ocidente, ou nós pereceremos”. Como se sabe, a vitória coube à contrarrevolução e a Revolução Russa pereceu, com a total impossibilidade dos soviéticos marcharem rumo ao socialismo. Diante das condições objetivas da Rússia, agravadas com a guerra interimperialista e a guerra civil, impuseram-se que, ali, se devesse implementar as tarefas próprias da revolução burguesa em um país em ruínas.

Esclareçamos: As condições objetivas impunham que se construísse, na URSS, o capitalismo, fosse na sua forma clássica ou através do capitalismo de Estado. Esse segundo caminho impôs-se ao custo de uma sangrenta disputa interna entre os setores revolucionários (Kronstadt) e os que se propunham à tarefa de tornar a URSS um país capitalista através do monopólio da economia pelo Estado, sob o controle absoluto do Partido único. 

O sr. Trotsky, em seu período de lucidez, isto é, em sua fase anterior a 1917, quando formulou, junto ao companheiro Parvus, a tese da revolução permanente, disse que: “Em países retardatários, como Rússia, China, Índia, Indonésia, caso se iniciasse um processo revolucionário, ele teria que ter um caráter evolutivo, crescente; do contrário, retroagiria”. Foi justamente o que aconteceu na URSS. A derrota levou ao capitalismo de Estado, sob o necessário auspício de um governo policial. A URSS renegou o grande legado político da revolução burguesa, expressa na democracia, e isso significou um profundo retrocesso histórico, significou um recuo de natureza fascista.

Mas o extremo pecado é que o recuo foi apresentado como avanço, como conquista e, calcado nessa falsificação dos fatos, o capitalismo de Estado foi apresentado sob o rótulo de socialismo. Na garrafa de veneno foi posto o rótulo: Leite e, dessa forma, cometeu-se e ainda se comete um hediondo crime contra a humanidade. Eis a nossa tragédia!

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Pôr os pingos nos is



Pôr os pingos nos is

Há mais de um século se definiu, com precisão, o caráter do Estado como instrumento político de dominação de uma classe por outra. Apesar dessa definição ter sido exaustivamente demonstrada, pouquíssimos são os que têm o domínio correto dessa questão. Não bastasse a crença corrente de que o Estado é fruto de um pacto social e tem uma função reguladora diante dos conflitos sociais e políticos, para o cúmulo do absurdo os “marxistas-leninistas” inclinam-se a propagar o estatismo. Na estreita cabeça dessa gente existe uma dicotomia formada pelo que se diz público (Estado) e privado. 

Para esses senhores, a propriedade estatal é do povo e a propriedade privada é da burguesia. Essa sandice revela o nível de rebaixamento teórico que nos legou os longos anos de hegemonia stalinista, cujo papel mais perverso foi a completa descaracterização dos fundamentos do socialismo.

O Estado é de classe. O Estado é o poder polÍtico. No capitalismo, o Estado burguês exerce o domínio completo sobre o conjunto da sociedade, através de suas mais diversas instituições. 

Dentre essas instituições tem-se, como exemplo, o braço armado da burguesia formada pelas Forças Armadas e policiais. Tem, também, a instituição chamada escola. Essa instituição, assim como as demais, surgiu com o advento da sociedade dividida em classes e camadas sociais. A escola foi criada e existe para cumprir dois propósitos básicos: O primeiro, formar mão de obra qualificada para tocar a economia; o segundo objetivo, é consolidar os preceitos ideológicos e jurídicos necessários à sustentação do sistema socioeconômico, em causa.

Diante do colapso do fraudulento discurso dos dois mundos, o “marxismo-leninismo” da Academia de Ciências da URSS e suas escolas similares, cedeu lugar aos “marxistas legais”, presentes nas academias burguesas. 

Dizem os incautos e os de má fé que as academias estão em disputa. Isso é falso. As academias, no capitalismo, são instituições regidas pelo Estado burguês para servirem aos interesses do próprio sistema. Lá, é que a burguesia se abastece dos quadros que necessita para tocar os seus negócios. Lá, vicejam técnicos, cientistas e uma larga massa de medíocres e uma farta parcela de charlatães, especialmente nas áreas ditas ciências humanas. 

Em razão de tantas distorções e fraudes é que se torna necessário expurgar, radicalmente, esses desvios conceituais e pôr os necessários pingos nos is.

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Social Democracia

Social Democracia

A maior herança imaterial deixada pela revolução burguesa foi, sem dúvida, a democracia política. A burguesia procedeu de forma radicalmente democrática, não por generosidade ou por esperteza. Ela necessitava promover a ruptura total com as amarras do feudalismo. Precisava realizar a mais ampla liberdade, fosse de natureza econômica, fosse de natureza política. 

Esse caráter democrático da proposta burguesa, já era exposto pelos enciclopedistas, ou seja, pelos teóricos que precederam a Revolução Francesa, destacando-se as figuras de Voltaire, Rousseau, Montesquieu, Diderot e D’Alembert. 

A democracia política, como produto do desenvolvimento histórico da sociedade, foi assumida pelos socialistas marxistas como uma grande conquista. Os socialistas marxistas, porém, acrescentavam que a democracia política não era o suficiente para os anseios libertários da humanidade. Reivindicavam, portanto, a democracia social, o que quer dizer, socialdemocracia.

Sociais democratas foram: Engels, Rosa Luxemburgo, Kautsky, Franz Mehring, Plekanov, Lenin, Trotsky, Martov e alguns outros. Entretanto, quando a Segunda Internacional Socialista capitulou e se converteu ao social patriotismo, a palavra socialdemocrata ficou enxovalhada. Em decorrência disso, abandonou-se a expressão socialdemocrata, então prostituída, passando a usar-se a expressão: comunista.

Mas, com a vitória da contrarrevolução e o advento do stalinismo, a palavra comunista tornou-se, também, imprópria, pois, em nome dela, foi praticado o mais ferrenho antissocialismo. Veja-se que, no transcurso dos acontecimentos, as denominações socialistas, socialdemocratas e comunistas tornaram-se expressões completamente degradadas.

Sob a denominação de comunismo deu-se um grande passo atrás, pois foi revogada a democracia política e instalado o totalitarismo de caráter fascista para viabilizar as tarefas de construção do capitalismo de Estado. 

 Rosa Luxemburgo dizia que podia haver liberdade política sem socialismo, entretanto, não poderia haver socialismo sem liberdade política. O que ocorreu na URSS, na China, nos “países socialistas” do leste europeu e em outros lugares, como Cuba e Coreia do Norte, foi a supressão absoluta da democracia política e isso significou e significa um retrocesso na caminhada da humanidade em busca de sua emancipação dos grilhões da desigualdade social. 

Esses fatos, essa trajetória histórica, necessitam ser vistos com toda profundidade para que nos libertemos da grande confusão teórica que foi imposta pela direita explícita e pela direita travestida de esquerda, sob o manto do “marxismo-leninismo” e do “marxismo-leninismo-trotskismo”. Eis uma questão que deve ser encarada com a necessária coragem, possibilitando assim, que possamos romper o cerco de aço e ferro que nos impediu e impede de ver, com a devida clareza, a verdade histórica. Em função dessa ausência de clareza, floresceram os mitos, as mentiras, as lendas e toda uma profusão de inverdades que nos cegaram e cegam, politicamente, impondo um sério nível de estreiteza, de rebaixamento no trato das questões políticas que se apresentam diante de nós. 

Eis o grande desafio de hoje: Ou romperemos com esse círculo de ferro e aço, ou estaremos fadados a testemunhar a falência da raça humana. Esse imperativo histórico nos leva à necessidade urgente de construir uma outra esquerda que já não pode ser denominada socialista, socialdemocrata ou comunista, dado o grande grau de prostituição a que chegaram essas expressões. Em função disso nos propomos expartaquistas, inspirados em Rosa Luxemburgo, embora reconheçamos que essa denominação não traduz, com eficácia, uma proposta de uma nova ordem econômica e social, pois prende-se, apenas, a um posicionamento político.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Adesivo


Outra esquerda



Outra esquerda

Há muito temos clamado, com muita insistência, pela urgência da construção de uma outra esquerda. Dizendo melhor, há muito pretendemos ressuscitar a esquerda revolucionária, sob pena de sermos arrastados, pelo capitalismo, para a tragédia total, para o fim da sociedade humana, para o fim da própria vida, como vem acontecendo quando rios, mares, lagos, florestas e faunas são dizimados, sistematicamente; isso sem falarmos na legião de jovens que são trucidados em função do crescente uso das drogas e da não menos crescente violência, tanto no trânsito como nas guerras.

Não sabemos se há tempo, historicamente hábil, para que se construa essa outra esquerda, de forma a evitar sucumbirmos na tragédia. No entanto, é de nosso dever envidar todos os esforços no sentido de viabilizar essa tarefa; afinal, já se disse: Viver é lutar. 

Mas o que significa uma outra esquerda? Antes de tudo, temos que considerar o fato de que, há mais de noventa anos, não temos uma verdadeira esquerda e, sim, um simulacro, uma falsificação digna dos camelôs piratas de nossas esquinas. Para melhor esclarecer essa questão, recorramos à história. O movimento socialista acumulou sucessivas derrotas. A primeira delas, foi por ocasião da Comuna de Paris, em 1871, quando o movimento operário, ombreado com militantes revolucionários, anarquistas e, minoritariamente marxistas, lograram uma vitória momentânea, assumindo o poder por setenta e dois gloriosos dias na capital francesa. 

Seguiu-se, a esse momento, uma acachapante derrota. A contrarrevolução burguesa massacrou, impiedosamente, os insurretos, o que confirma a máxima do poeta de que “os inimigos não mandam flores”.

Mas essa derrota da Comuna de Paris foi plenamente assumida e ensejou a produção de uma rica literatura socialista. Referindo-se a esse episódio, Karl Marx afirmou que o proletariado tendia a lamber suas feridas e aprender com suas derrotas para prosseguir na luta bem mais fortalecido e traquejado. 

Posteriormente, quando se avizinhava o desfecho de uma guerra interimperialista, o movimento socialista experimentou um novo e profundo embate. Dessa feita, de um lado, estava a burguesia imperialista empenhada em promover a guerra pela redistribuição do mercado e das fontes de matéria prima. Mas ante tal feito, a guerra, seria impossível para eles, caso não contassem com o apoio devotado e irrestrito da sociedade. Dessa forma, conscientes de que a guerra não é um feito estritamente militar, tornava-se claro para a burguesia imperialista a necessidade de contar com todo o apoio da retaguarda e isso só poderia se dar através da agitação plena da defesa da pátria, da defesa nacional. Para lograr êxito em comover o povo trabalhador para o exercício da guerra, a burguesia, em litígio entre suas facções, soube convocar seus políticos, seus tribunos, seus poetas, seus artistas, seus compositores, seus escritores, para levar o povo à histeria nacionalista. Um povo pronto a derramar seu próprio sangue para a consecução de uma guerra que não era sua. Isto, fazia-se necessário, e a burguesia obteve êxito total nesse seu empenho. 

Por outro lado, estavam os socialistas revolucionários, que diziam ser dever dos trabalhadores evitar a guerra, pois ela não lhes pertencia, não lhes interessava. Mas, se por acaso, isso fosse impossível, devia-se negar a matança nas trincheiras e voltar as armas contra os seus opressores, a burguesia, promovendo insurreições socialistas.

Entre essas duas forças em luta, a contrarrevolução imperialista e a revolução socialista, a primeira força triunfou e o seu triunfo, na Europa ocidental, estendeu-se a URSS, estendeu-se ao mundo inteiro. A grande tragédia, diferentemente do que ocorreu com a Comuna de Paris, a derrota não foi assumida e cometeu-se o maior de todos os crimes contra a humanidade, qual seja, o de apresentar a derrota como se fora vitória. A partir daí, a contrarrevolução stalinista travestiu-se de esquerda e, em nome dessa presumida esquerda, cometeu-se e comete-se ainda, as maiores barbaridades contra a humanidade. 

E, assim sem essa “esquerda”, rotulada de “marxista-leninista” e “marxista-leninista-trotskista”, o capitalismo não estaria de pé e não teria praticado tantos desatinos, como foram a ascensão do nazifascismo, o holocausto, Hiroshima e Nagasaki, a derrota da revolução socialista na Espanha, na Grécia e, sobretudo, na França e na Itália pós-guerra. 

Uma outra esquerda, uma esquerda realmente revolucionária tem, primeiro que tudo, assumir as derrotas do movimento socialista. Depois disso, deve denunciar que todos os hediondos crimes, praticados sob o rótulo do “marxismo-leninismo”, se deram no processo de construção do capitalismo de Estado. Eis a pedra fundamental para a reedificação de uma outra esquerda.

Ao lado do reconhecimento das derrotas, temos que repor as máximas do socialismo revolucionário com a reposição do princípio da luta de classes, como o motor da história, expurgando o conceito vil de nação opressora, de nação opressora versus nação oprimida, como contradição fundamental que rege o processo histórico. Uma outra esquerda só nascerá de um gesto de coragem para que se ponha por terra os mitos, as lendas, as mentiras e, sobretudo, a deturpação dos conceitos que o stalinismo construiu e constrói. 

Uma outra esquerda só poderá existir, caso se tenha a coragem em dizer, de demonstrar que o “rei está nu”. Uma outra esquerda não poderá usar de meias palavras e terá de assumir que os crimes do stalinismo, de ontem e de hoje, são crimes da contrarrevolução e, jamais, do socialismo, como apregoa a direita explicita.

Uma outra esquerda terá por método a persuasão, o convencimento e, jamais, se constituirá em tropa de choque disposta à truculência e a expedientes de baixo nível, como a mentira desbragada, a calúnia, a desqualificação infundada dos oponentes e outros tipos de condutas que nada têm a ver com uma postura realmente socialista. 

Enfim, é crucial ressaltar, que a democracia política foi o grande legado que nos deixou a história, através da revolução burguesa. Esse legado político não foi rejeitado pelos grandes expoentes do marxismo. Diante dele, do legado democrático, afirmaram: Tudo bem, nos apraz a democracia política que nos permite o direito de ir e vir; o livre debate; a liberdade de reunião e organização; o voto universal e secreto... Entretanto, isso não nos basta; além da democracia política queremos, sobretudo, a democracia social, ou seja, queremos a social democracia.

Para cumprir a tarefa de construir o capitalismo de Estado, foi necessário promover a revogação completa da democracia política e instalar um governo extremamente policial. Nasce, pois, o fascismo, e o nosso grande drama é que esse fascismo teve como berço a URSS, apresentando-se com a roupagem de esquerda, afirmando-se construtores do socialismo e, em nome disso, praticando os já citados hediondos crimes, enquanto a fatura, o pagamento, ficou por conta da humanidade que amargou e amarga seus nocivos efeitos. 

Uma outra esquerda há que reconhecer e denunciar o caráter totalitário e fascista da contrarrevolução travestida de “marxista-leninista”. Lembremos Rosa Luxemburgo quando disse: “Pode haver liberdade política sem socialismo, porém não pode haver socialismo sem liberdade política”.

O nazifascismo processado, na Itália e na Alemanha, foi justamente a revogação absoluta da democracia política e isso aconteceu, antes de tudo, na URSS, como fizemos questão de ressaltar, para depois se repetir no processo chinês, na Coreia do Norte, nos “países socialistas” do leste europeu, no Camboja, em Cuba... 

Uma outra esquerda tem que passar a história em pratos limpos, desfazendo lendas, mentiras, embustes, charlatanismo e, sobretudo, a falsificação dos fatos. 

Ousamos propor, que essa outra esquerda seja chamada de “espartaquista” como forma de resgatar Rosa Luxemburgo, Julio Martov, Parvel Axerold, Alexandra Kollontai, Franz Mehring, Georgi Plekhanov, Karl Kautsky, Leon Trostky, de 1904, e outras figuras do socialismo revolucionário.